quarta-feira, 14 de maio de 2008

Passageiros da classe sub-turística


Estive incluída nessa categoria de passageiros numa viagem de Orlando a Fort Lauderdale em março deste ano. Mas antes, um preâmbulo: nos EUA existe uma única empresa de ônibus que atua por todo o país, a Greyhound. Os veículos em si não são muito diferentes daqueles que costumo usar aqui no Brasil no meu trajeto São Paulo – Ourinhos: meio apertados, meio desconfortáveis, não muito limpos, mas fazer o quê? O grande diferencial dos Greyhounds são seus passageiros.

Bem atrás de nós (estávamos eu e dois amigos brasileiros – a Carla e o Leandro), sentaram-se dois casais estranhíssimos. Era difícil decidir se eles pareciam ter acabado de sair de uma penitenciária ou de um sanatório. Uma das mulheres tinha marcas de cortes nos braços que eram sistemáticas demais para serem conseqüência de um acidente. Seus olhos vidrados denunciavam que ela mesma tinha se cortado. A outra mulher era quase um homenzinho e seus companheiros eram velhos gordos e usavam chapéus. Todos falavam alto, davam risadas exageradas e pareciam personagens de algum filme trash, moradores de trailers de algum semi-deserto dos EUA e criminosos em potencial. É sério: nunca vi pessoas tão feias em toda a minha vida.

Do meu lado estava uma velhinha canadense muito simpática. Logo que me sentei ao seu lado, ela contou que estava indo a Fort Lauderdale para visitar sua irmã, que, no dia seguinte, faria 90 anos. Ela me contou exatamente a mesma história depois que acordou de um cochilo de meia hora. Fiquei calculando quantas vezes eu teria que fingir surpresa ao ouvir as mesmas coisas ao longo do percurso de cinco horas até Fort Lauderdale. Mas durante o resto da viagem ela pareceu bem lúcida e manteve uma conversa coerente comigo e com meus amigos.

Ela, afinal, tinha toda a razão de se confundir um pouco: estava viajando de ônibus há dois dias, desde Toronto, Canadá. Fiquei imaginando ao lado de quantas pessoas ela já havia se sentado desde então e para quantas pessoas ela já tinha contado suas histórias tristes: ela costumava vir para a Flórida com o marido todos os anos durante o inverno. Mas agora já fazia 15 anos que não vinha: da última vez, o marido foi dormir uma noite na casa de veraneio e não acordou mais. Também contou da filha, de 60 anos, que trabalha atendendo os telefonemas do 911, o serviço de emergência dos EUA. Finalmente, manifestou sua apreensão com relação à irmã: não sabia se ela ainda dirigia bem o suficiente para ir buscá-la na rodoviária (com 90 anos, imaginei que não).

Chegando à Fort Lauderdale, não tive a oportunidade de conhecer a nonagenária, que confundiu a data e achou que a irmã chegaria no dia seguinte. Nossa amiga teve que tomar um táxi. Quanto a nós, ficamos esperando a tia da Carla (na verdade, tia da mãe dela), que ela mesmo nunca tinha visto. A gente ficava olhando despretenciosamente para cada carro que estacionava, tentando identificar traços brasileiros nas senhoras que dirigiam. Finalmente fomos apanhados e nos sentimos em casa no percurso até Boca Raton, passando pela beira da praia e por condomínios luxuosos.

*Foto: eu, Leandro e Carla na rodoviária de Fort Lauderdale. Essa quarta pessoa ao fundo é um dos passageiros do ônibus

3 comentários:

idéias da Cris disse...

mariana andar de ônibus, tem lá suas vantagens além da passagem ser mais em conta dá para observar a vida como ela é, tentar descobrir um pouco de como é a vida dos outros, conhecer pessoas, enfim, se interar da cultura deste país, legal, poder vivenciar ...

Rita disse...

Saudosa Greyhound!!
uhahuahuhu

Unknown disse...

nossssss...qto detalheee.....eu estava la mesmo???hehehe....caamba sou mto esquecido...rsrs....